"Já que é para começar a assistir a uma série, vou maratonar de uma vez". "Ou faço bem-feito ou nem começo". "Não tem essa de conhecido. Ou é amigo ou não é". Essas expressões são familiares para você? Com certeza, se não é o próprio interlocutor de alguma delas, conhece alguém que vive nos "extremos". No Faz Sentido do último domingo, 13 de fevereiro, a jornalista Fabiana Sparremberger recebeu o psicólogo Carlos Eduardo Seixas, o Cadu, para mostrar um pouco mais do perfil 8 ou 80. Confira um pouco dessa conversa.
Fabiana - Quem são as pessoas 8 ou 80?
Cadu - Temos um padrão. O 8 ou 80 tem algumas definições. Gosto de usar a analogia do "tudo preto ou branco" para definir aqueles que não conseguem ver um "cinza" no meio das situações. Esse perfil é atribuído à maneira com que se interpreta informações e acontecimentos. Quem tem esse tipo de padrão foi acostumado a avaliar tudo de duas maneiras, a certa ou a errada, sem meio termo.
Fabiana - Viver sem o meio termo pode nos impedir de enxergar possibilidades?
Cadu - Sim. Eu costumo passar que, entre o certo e errado, tem o melhor e o pior. Existem outras formas de a gente enxergar a vida. Por exemplo, você ama ou odeia todas as pessoas a sua volta ou existe o meio termo nestes sentimentos?
Fabiana - Essa questão tem vários meios termos, claro.
Cadu - Essa resposta já mostra que você não apresenta o padrão 8 ou 80, pois consegue perceber a diferença entre o desenvolvimento das relações. Ou seja, na vida, existe um contínuo que liga um ponto ao outro. Precisamos aprender a andar no meio deles.
Fabiana - Quando digo que não amo nem odeio, quebro o padrão dicotômico?
Cadu - Exatamente. O padrão 8 ou 80 é muito complicado, envolve rigorosidade de ideias. Se formos analisar os aspectos políticos do Brasil atualmente, veremos um padrão dicotômico. É esquerda ou direita, é salvador ou demônio. O pensamento dicotômico nos deixa refém. São pessoas que tentam controlar tudo.
Fabiana - Quando consideramos o meio termo e o "talvez", ficamos mais leves?
Cadu - Até mesmo o silêncio é uma forma de se posicionar. A visão que temos do mundo vem da nossa criação. Se crescemos em um ambiente com características rigorosas, iremos nos tornar inflexíveis.
Fabiana - A maneira de interpretar as situações também pode nos fazer reféns?
Cadu - Sim, porque sempre há a distorção de pensamento. Muitas vezes, nosso problema, não é o fato em si, mas a maneira como o interpreto. Trata-se da constante tentativa fracassada de ter o controle de tudo. Às vezes, o mundo é completamente oposto do que eu vejo. Não avaliar o meio termo é angustiante e pode levar à ansiedade.
Fabiana - E, quando decide mudar, a pessoa 8 ou 80 vai para o outro extremo?
Cadu - Sim, isso é completamente normal, já que o funcionamento dela é dicotômico e rigoroso. Destaco, de novo, que são as distorções, ou seja, um padrão de pensamento. Um exemplo é a catastrofização, quando vamos para o extremo na iminência de que algo vai dar errado.
Fabiana - Uma das perguntas que fizemos na enquete é a respeito do relacionamento morno. A maioria rejeita essa possibilidade. Só que relacionamentos não têm que ser intensos o tempo todo?
Cadu - Claro que não. Imagine conviver com uma pessoa intensa desde que abre o olho até dormir. Entre 0º a 50º, qual é a temperatura melhor? Entre o verão e o inverno, existe o outono. O equilíbrio é sempre melhor.
Fabiana - Ainda a respeito das distorções cognitivas ou leitura mental, ficar todo o tempo interpretando o pensamento dos outros é complicado. E as consequências?
Cadu - É complicado, sim. É um problema que, certamente, vai gerar ansiedade e depressão. A leitura mental é tão perigosa quanto à previsão de futuro. São ações que reforçam tudo o que eu não sou capaz de enfrentar, sendo que nem passei por aquela situação. Além disso, a repetição a do mesmo pensamento se torna uma crença.
Fabiana - Então, analisar tudo pelo fato negativo é um padrão de pensamento?
Cadu - Sim, a previsão negativa é do ser humano. O problema é nunca perceber as situações que podem dar certo.
Fabiana - E como mudar esse padrão para conseguirmos achar o lado positivo das situações?
Cadu - Sozinho é muito difícil mudar porque, normalmente, esse é um funcionamento automático. A pessoa que tem um viés de previsão negativa não consegue ver o outro lado, não consegue sair disso. Gosto muito de usar o termo "filtro cognitivo". Se estamos vendo um filme, provavelmente a cena que vai te marcar é a que vai bater com sua história de vida. Nós filtramos o mundo usando uma lente adequada ao radar que a gente tem.
Fabiana - Não revelar a posição política para evitar discussões, mas revelar o clube de futebol de preferência... Isso também é ser 8 ou 80?
Cadu - Estar em cima do muro também é uma posição. Eu, por exemplo, não revelo a minha posição política, até porque não faço questão do assunto. Quanto ao meu time, é outra história. Às vezes, não me conhecem como Carlos Eduardo, mas sim como gremista (risos).
Fabiana - E quanto a ser sincero acima das circunstâncias, doa a quem doer?
Cadu - O problema não é ser sincero ou não, mas como se expõe o assunto. A verdade é sempre importante, mas precisamos avaliar o momento da pessoa e a forma de dizer. Falar "tudo" de uma vez pode ser destrutivo.
Fabiana - Outra característica do 8 ou 80 é não aproveitar momentos bons. A pessoa já fica imaginando que algo ruim virá logo após a alegria?
Cadu - Esse é um padrão de ansiedade. A pessoa não aproveita o que está bom. Para ela, essa é uma questão lógica: se está tudo bem, cedo ou tarde, algo negativo vai acontecer, é da vida.
Fabiana - E como que a gente sai desse pensamento automático?
Cadu - Temos que fazer um elo entre o "preto e branco" e caminhar pelos tons de cinza, que vai do claro ao escuro. A gente costuma atribuir resultados a si e aos outros, como se fôssemos nós ou outras pessoas os culpados de determinada situação. Os perfis 8 ou 80 são fatalistas quanto aos graus de responsabilidade com tudo na vida.
Fabiana - Quando a gente consegue sair dessa dicotomia, o sentimento é de libertação, afinal, é bom destacar que ninguém tem o controle de tudo. Sem falar que a vida fica mais leve quando aprendemos que somos "parte" e não totalmente responsáveis pelo sucesso ou insucesso?
Cadu - Bem isso. Chega de vivermos de maneira automática. Quando você sentir raiva, tristeza e ansiedade, sempre questione a primeira interpretação. Isso vai ajudar a quebrar um ciclo vicioso.
O FAZ SENTIDO FOI ÀS REDES E PERGUNTOU
Você é 8 ou 80?
- Bem isso 62%
- Nem um nem outro 38%
- 347 participações
Relacionamento morno para você
- Nem pensar 61%
- É uma questão de adaptação 24%
- É bom também 14%
- 312 participações
Amigo ou conhecido?
- Ou é amigo ou não é 30%
- Sei separar 70%
- 306 participações
Se não for para fazer bem-feito...
- Nem faço 48%
- Depende 27%
- Tento igual 24%
- 325 participações
Disfarçar quando não gosta de alguém
- É importante tentar 38%
- Não disfarço mesmo 46%
- Superdisfarço 14%
- 279 participações
Dizer a verdade de uma vez ou nunca mais tocar no assunto?
- Digo na hora 33%
- Avalio a situação com calma 61%
- Eu, hein? Não falo nada 5%
- 283 participações
Ao imaginar algo negativo
- Já espero as piores consequências 38%
- Contemplo a solução 35%
- Para que sofrer antes 26%
- 238 participações
9. Quanto aos aspectos positivos da sua vida...
- Não dou valor a eles 5%
- Dou valor a tudo de bom que acontece 83%
- Se tá bom, já vem algo ruim na sequência 12%
- 234 participações
Alguns comportamentos das distorções cognitivas
- Pensamento "tudo ou nada"- Enxergar tudo em categorias, sem meio termo
- Catastrofização - Prever o futuro negativamente, sem considerar resultados positivos
- Supergeneralização - Tirar uma conclusão negativa radical que vai muito além da situação
- Leitura mental - Achar que sabe o que estão pensando da gente
- Argumentação emocional - Pensar que algo deve ser verdade porque sente. Desconsiderar evidências contrárias
- Personalização - Considerar-se causador de algum fato negativo externo pelo qual não é o principal
- Filtro mental - Prender-se a um detalhe negativo de uma situação e desconsiderar o quadro geral
- Desconsiderar o positivo- Crer que as experiências, atos ou qualidades positivas serão acompanhadas de dias ruins
PRÓXIMO PROGRAMA
A vulnerabilidade é uma fraqueza ou pode ser uma força? Esta e outras questões abordadas no livro "A coragem de ser imperfeito" são temas do Faz Sentido deste domingo, com Fabiana Sparremberger e a psicóloga Suséli Santos. Não perca! Às 11h, na CDN e TV Diário